Lucas de Souza Teixeira mora em um barraco na Favela Heliópolis, zona sul de São Paulo. Em seu nome, a polícia encontrou uma empresa que movimentou mais de R$ 10 bilhões em pouco mais de dois anos, a Cash Back Turismo e Serviços Empresariais.
No que é apontado pelos investigadores como um dos maiores esquemas de lavagem de dinheiro do Estado, Teixeira é dono de um “banco do crime”, que limpou capitais de organizações criminosas que atuavam na Junta Comercial de São Paulo, realizou fraudes bilionárias em criptomoedas ou estavam vinculados ao Primeiro Comando da Capital (PCC).
Nomes como Francisley Valdevino da Silva, o Sheik dos Bitcoins, surgiram nas investigações, investigado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Pirâmides Financeiras e pela Polícia Federal (PF) sob acusação de estar por trás de fraudes no valor de R$ 4 bilhões . , que teve entre outras vítimas a modelo Sasha Meneghel, filha da apresentadora Xuxa, e o jogador de futebol Gustavo Scarpa.
A história de como os nomes de Lucas e do Bitcoin Sheik foram parar no meio dessa confusão ficou quase esquecida, entre processos e investigações paralisadas devido ao debate sobre uma tese jurídica nos tribunais superiores: o compartilhamento ou não de Relatórios de Inteligência seria constitucional (RIF) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) com órgãos de persecução penal para fins penais, sem necessidade de autorização judicial? Os Tribunais discutiram durante cinco anos até que o Supremo Tribunal Federal (STF) disse que sim: o compartilhamento de dados é legal.
STJ x STF. Enquanto os policiais verificavam em Brasília quem estava certo, centenas de investigações ficaram paralisadas no país. O argumento de inconstitucionalidade havia sido defendido em 2019 pela defesa do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), no caso da cisão, e havia sido rejeitado pelo STF, em 2019. Mas foi retomado em 2023 pelo Superior Tribunal de Justiça Justiça (STJ), ao analisar recurso da Cervejaria Cerpa, em inquérito no Pará. O senador e a empresa alegaram inocência e disseram ter sido alvo de investigações ilegais.
Em 2019, o Ministério Público Federal avaliou que a paralisação das investigações, ordenada pelo ministro Dias Toffoli antes de julgar o recurso do senador, afetou 935 casos, incluindo a Lava Jato. Agora, os efeitos da decisão do STJ, derrubada pela 1ª Turma do STF no dia 2 de abril, não foram calculados.
Em São Paulo, o último efeito da decisão do STJ foi revertido no dia 18 de abril, quando a 1ª Vara de Crimes Fiscais, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores Mobiliários da Capital decretou o bloqueio de R$ 191 milhões em bens de empresas e pessoas físicas que gravitou em torno do Cash Back Tourism e Business Services.
A história do Cash Back começou com uma investigação sobre um esquema de fraude e lavagem de dinheiro na Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp). Oito réus foram acusados de constituir organização criminosa que alterou contratos sociais de pessoas jurídicas. Incluíram empresas laranja em seu quadro societário, bem como alteraram o endereço e o objeto social e aumentaram o capital social das empresas, fazendo-as parecer aptas a atuar no mercado financeiro para a prática de golpes.
E assim uma empresa de moda passou a ser a Team Work Participações, com o nome fantasia 360 Bank. “A organização criminosa passou a utilizar o 360 Bank para atuar no mercado financeiro, capturando clientes/vítimas que, na esperança de obter retorno econômico de seus investimentos, repassavam suas economias ao grupo criminoso”, disse o promotor Danilo Pugliesi em a denúncia, em 2023.
BANCO 360. Entre as dezenas de vítimas do grupo estava Maristela Rodrigues Bagnatori, que foi convencida por um representante do Banco 360 a investir R$ 265 mil por meio de uma das empresas do grupo, a Plattion Assessoria e Consultoria. O delegado Marcos Galli Casseb, do 30º Distrito Policial, cruzou informações desta investigação com relatórios do Coaf e verificou que 360 empresas do Grupo utilizaram o Cash Back para comprar ativos. Tratava-se, segundo a investigação, de um banco falso que utilizava outro banco criminoso para branquear o dinheiro, “integrando bens ilícitos provenientes de diversas atividades criminosas e devolvendo-os aos agentes investidores como bens jurídicos, uma vez que assumem a posição de clientes”. O volume de créditos e débitos nas operações bancárias com participação do Cash Back foi de R$ 10 bilhões.
O delegado solicitou o bloqueio de R$ 191 milhões do Cash Back, mas o juiz Leonardo Valente Barreiros, da 1ª Vara, negou o pedido com base na decisão do STJ, que questionava a legalidade do uso de informações do Coaf sem ordem judicial. O magistrado declarou a nulidade dos relatórios do Coaf solicitados pela 30ª DP, afirmando que “tratou-se de ato ilegal” por falta de autorização judicial. O Ministério Público Estadual recorreu da decisão e obteve liminar após o STF concluir que sua decisão de 2019 era válida e deveria ser acatada pela Justiça, enterrando a decisão do STJ, que havia paralisado a investigação do 30º DP.
Com isso, o magistrado escreveu que conseguiu verificar nos autos que o Cash Back seria utilizado para lavagem de dinheiro, funcionando como um “verdadeiro banco criminoso”. Seu proprietário formal era Teixeira, morador de Heliópolis. Ele não seria, porém, uma “laranja inconsciente”, pois inquéritos policiais mostraram que ele se identificou como dono da empresa.
A 30ª DP constatou que a maioria das empresas que repassaram valores para Cash Back não possuía funcionários, o tempo entre abertura e fechamento foi curto (menos de dois anos) e negociaram com pessoas físicas e jurídicas que não atuavam em suas filiais . Foi o caso da Intercore Intermediação de Negócios, que transferiu R$ 600 mil para Cash Back. A Intercore seria controlada pelo Bitcoin Sheik, preso pela PF em 2022 e libertado pelo STJ em 2023.
O principal destino dos recursos de Cash Back foi a empresa Mozzatto Consultoria e Intermediação, que recebeu R$ 159,5 milhões por meio de 631 operações. O valor é quase todo o capital integralizado pelo Cash Back – R$ 190.910.516,48. Fundada em 2023, os sócios da Mozzatto são Thiago Favoretto Mozzatto e a empresa Flix Payments Ltda, com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, no Caribe.
OPERADOR. Mozzatto é um comerciante de criptomoedas. Foi acompanhando seus movimentos que a polícia descobriu que ele era o verdadeiro dono do Cash Back. E descobriu que o dinheiro já tinha sido transferido para as Ilhas Virgens Britânicas.
Ó Estadão Procurou o seu advogado – Guilherme Lopes Pacheco – mas este não respondeu. A reportagem não localizou a defesa de Sheik, Teixeira e 360 Bank. Sempre que deram declarações, negaram fraude. O bloqueio de mercadorias afetou, além do Cash Back, Mozzatto Consultoria e Flix Payments. Teixeira e Mozzatto.
Depois de o caso ter sido paralisado devido à disputa nos tribunais superiores, a 30ª DP espera agora recuperar os recursos desviados antes que novos debates jurídicos sirvam para garantir a impunidade de quem se apropriou das poupanças das vítimas.
A informação é do jornal O Estado de S. Paulo.
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